No dia 07 de novembro do ano corrente a Comissão Interamericana de Direitos Humanos – CIDH/OEA realizou uma visita ao município de Alcântara para acompanhar a situação das comunidades quilombolas e suas reivindicações pela permanência em seus territórios étnicos. A visita fez parte de uma agenda da CIDH/OEA no Brasil e percorreu municípios dos Estados da Bahia, Maranhão, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Roraima, São Paulo e Rio de Janeiro.
Em Alcântara a visita foi realizada pelo Comissário Joel Hernández García e teve como atividades a realização de duas reuniões e visitas a duas agrovilas e à comunidade quilombola de Mamuna.
A primeira reunião aconteceu na sede de Alcântara no Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais – STTR, e contou com a participação de representantes de movimentos sociais, notadamente do Movimento dos Atingidos pela Base (MABE), do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Alcântara (MOMTRA), Sindicato dos Trabalhadores da Agricultura Familiar (SINTRAF), Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB), Associação do Território Étnico Quilombola de Alcântara (ATEQUILA-ALC), SEDES (cozinhas comunitárias), Movimento dos Sem Terra (MST). Destaca-se ainda a presença dos representantes da Defensoria Pública do Estado do Maranhão, Defensoria Pública da União, Secretaria de Estado de Direitos Humanos e Participação Popular (SEDIHPOP), Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), professores do Programa de Pós Graduação em Cartografia Social e Política da Amazônia-PPGCSPA da Universidade Estadual do Maranhão-UEMA.
Na ocasião foram apresentados os principais desafios enfrentados pelas comunidades quilombolas face à implantação do Centro de Lançamento Aeroespacial (CLA) na década de 1980. Os agentes sociais e representantes dos movimentos sociais organizados de Alcântara, ressaltaram ao comissário a realização da perícia antropológica, autorizada pelo Ministério Público em 2002, para identificação das comunidades quilombolas e delimitação do território quilombola historicamente reconhecido pelos agentes sociais. Foi apresentado o mapa situacional do território quilombola, bem como ressaltado os acordos de não expansão do CLA e a retomada dessas discussões entre o Brasil e os Estados Unidos no presente.
Logo em seguida foi entregue ao comissário um documento em que consta esses processos da luta pelo reconhecimento do território como sendo quilombola e as reivindicações do presente, sendo:
- A imediata titulação do território quilombola de Alcântara, nos termos do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação publicado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) em 04 de novembro de 2008;
- Que o Estado Maranhão declare publicamente o erro histórico cometido na expedição do Decreto Estadual nº. 7.820 de setembro de 1980 que desapropria compulsoriamente as comunidades, em pleno regime militar, e formalize pedido de desculpas às comunidades quilombolas de Alcântara;
- O CLA só foi possível nos moldes que se instalou devido à anuência do Estado do Maranhão que submeteu as comunidades de Alcântara as arbitrariedades dos militares dá época, pelas quais sofrem até os dias atuais, sobretudo, naquilo que lhes é mais caro, o acesso a terra/território;
- Que o governo brasileiro adote medidas com vistas a respeitar o cumprimento de sentença judicial prolatada nos autos do processo nº. 2008.37.00.003691-5, em que o governo brasileiro se compromete em não realizar novos deslocamentos das comunidades quilombolas de Alcântara, tampouco, expandir o CLA sobre o território destas comunidades;
- Que o Estado brasileiro adote procedimento de consulta junto às comunidades quilombolas de Alcântara para obtenção do seu consentimento prévio, livre e informado acerca das medidas que afetem suas vidas, principalmente, no que tange ao uso e gestão do território tradicionalmente ocupado, em observância aos tratados internacionais de direitos humanos, notadamente, a Convenção 169 da OIT;
- Que Estado brasileiro adote os meios e medidas necessárias a permitir que as comunidades quilombolas de Alcântara participem dos lucros gerados pelas operações do CLA e suas demais atividades econômicas, como medida de reparação dos danos sofridos ao longo de décadas;
- Que o Estado brasileiro adote todas as medidas possíveis para realizar o estudo impacto ambiental do CLA apontando os possíveis impactos e danos causados a sociedade alcantarense.
(Consoante Documento entregue ao Comissário Joel Hernández García. Alcântara, 07 de novembro de 2018)
Após a reunião do STTR os representantes das organizações presentes se deslocaram para as agrovilas de Pepital e Marudá onde puderam acompanhar as situações das famílias que foram deslocadas nos anos de 1986 para que fosse efetivada a implantação do CLA. Na ocasião, a senhora Maria Luiza do MOMTRA e o senhor Antônio Marcos do STTR expuseram suas preocupações com as possibilidades de novos processos de deslocamento caso seja efetivado acordo entre o Brasil e os Estados Unidos.
A visita do CIDH/OEA se encerrou na comunidade de Mamuna onde foi realizada outra reunião entre o Comissário e as lideranças locais. No decorrer da reunião foram colocados os diferentes tipos de problema que provocam a imobilização do projeto de vida dessas comunidades frente às constantes ameaças de deslocamento compulsório das famílias de quilombolas. Foi ainda apresentado os argumentos a favor da permanência no território de modo a fundamentar a defesa dos mecanismos de reprodução física e social das comunidades quilombolas e explicitar a pauta de reivindicações dos movimentos sociais.
OEA avalia que expansão do Centro de Lançamento, anuncida pelo Governo Federal, viola direitos humanos dos quilombolas. Confira video da reportagem pelo link abaixo.