Nova Cartografia Social Da Amazônia

Projetos Hidrelétricos no Sudeste do Pará: Experiências sociais e questões socioambientais


Em continuidade ao Ciclo de palestras Comunicações em Cartografia Social, ocorreu no auditório do Campus Universitário de Marabá/UNIFESSPA, no dia 25 de fevereiro de 2014 o Café com Ciência no tema: Experiências sociais e questões socioambientais em projetos hidroelétricos no sudeste do Pará. O evento reuniu nos períodos da manhã e tarde, respectivamente, mais de 75 e 78 pessoas. A atividade resulta das ações da Nova Cartografia Social da Amazônia e do Projeto MAPEAMENTO SOCIAL como instrumento de gestão Territorial contra o desmatamento e a devastação: Processo de Capacitação de Povos e Comunidades Tradicionais realizadas no Sudeste do Pará, sobretudo, desde 2011 e as que ocorreram em 2013. A palestra na discussão dos projetos hidroelétricos e das questões socioambientais contou com o apoio da Comissão Pastoral da Terra – CPT e do Observatório Socioambiental do Sudeste Paraense.

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A temática, das obras e projetos hidrelétricos, trazida para debate se acerca as discussões a serem travadas no Seminário parcial: Carajás 30 anos, que ocorrerá em Marabá, de 21 a 23 de março de 2014. Pois, os projetos hidroelétricos são questões em aberto na realidade amazônica e persistem como modelo energético para a região. E, como expressão vultosa dos empreendimentos de infraestrutura do Programa Grande Carajás (PGC), criado na década de 1980. Cujo componente de maior expressividade é a extração de minério de ferro na Serra de Carajás.

O debate sobre as questões socioambientais, e os impactos dos projetos hidroelétricos no sudeste do Pará pautou inicialmente as experiências sociais dos atingidos por obras no Rio Tocantins. Assim, após a exibição do documentário “Tocantins rio afogado”, Esmael Rodrigues Siqueira, membro da Associação das Populações Organizadas Vítimas das Obras no Rio Tocantins e Adjacências – APOVO relatou várias situações decorrentes da implantação da UHE de Tucuruí, de sua ampliação e da construção das eclusas.

Para Esmael que vive em Tucuruí: “é triste o que acontece na construção de hidrelétrica”. Um dos problemas está na perda das terras, houve “pessoas que contavam com até 20 alqueires de terra e que receberam a promessa do remanejamento”. Entretanto, transferidos para outras áreas, sofreram com a “malária e pistolagem” e sem a segurança de novo local de moradia e trabalho. Outra questão apontada é o fato de que cada vez mais se alude a problemática da água e de sua escassez no mundo. Entretanto, as barragens vêm poluindo em enormes quantidades, afirma Esmael. Para o palestrante, nesse caso é ilustrativo o que ocorreu com as “madeiras mortas com o agente laranja e afogadas no lago de Tucuruí”. Além disso, nas construções utilizam-se produtos como a amônia e que tendem a contaminar as águas que são consumidas por ribeirinhos, moradores de ilhas.

Esmael relatou ainda, que Tucuruí passou a enfrentar questões de abastecimento, uma vez que a população que plantava, deixou de plantar. E que desde as primeiras demissões das construtoras os problemas sociais e a violência se adensaram no município e, sobretudo na cidade. Além disso, em termos sociais e ambientais no referente as “condicionantes” acordadas para a construção da barragem elas não são cumpridas. O Estado e suas agências não têm atuado nesse sentido. Já os movimentos sociais na medida em que atuam, protestam, tendem a ser criminalizados e reprimidos.

Ele acrescentou também que a construção de Unidades de Conservação que foi uma demanda dos próprios movimentos sociais e atingidos por barragem na região do lago de Tucuruí, passou a ser um problema a medida em que não houve investimentos, administração e atuação condizente com as expectativas que se tinha ao criá-las. Em muitas delas as pessoas enfrentam e estão expostas a problemas ambientais e de saúde.

As atividades do projeto Mapeamento Social em Tucuruí aconteceram no mês de junho e outubro de 2013, das quais está sendo elaborado o Boletim Informativo com a descrição das situações e dos grupos sociais afetados pela UHE Tucuruí.

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Kátia Silene Costa, da aldeia Akrãtikatêjê na Terra Indígena Mãe Maria, por sua vez relatou as situações sociais vivenciadas por seu povo no sudeste do Pará. O povo Gavião da Montanha foi expropriado de suas terras para implantação da UHE de Tucuruí. Dada à experiência de Tucuruí argumenta que não quer mais “que aconteça a construção de barragens”.

Ela diz que seu povo matinha uma relação muito forte com os rios e com a pesca. Hoje já sofrem com a escassez dos peixes e perda dos rios. Ela contou que costuma relatar a seus filhos sobre a fartura de que antes era testemunha. Dessa maneira argumenta que muitos dos peixes quais conheceu seus filhos apenas conhecem por história. Pois, não tiveram oportunidade de conhecer “aquele rio rico que não tem mais”. Ressaltou, também, que a luta pela compensação das terras perdidas, para a Eletronorte, é dificultada pelo fato de “não existir terra equivalente a que tinha em Tucuruí”. Assim, Kátia Silene ressalta: “não queremos nova barragem”. Isso por referência a que está sendo planejada e chamada de UHE de Marabá.

Alunas da habilitação em letras do curso de Educação do Campo fizeram a leitura de um cordel narrando a trajetória do povo Akrãtikatêjê de Tucuruí à T.I Mãe Maria em Bom Jesus do Tocantins. Elaborado por Laíze Bizerrio de Oliveira que também é professora e vive e na aldeia Kyikatejê. O mesmo foi recitado em português e na língua indígena, com tradução feita por professor indígena da mesma aldeia. Entre os Akrãtikatêjê também foram realizadas atividades de pesquisa e Mapeamento social pela participação dos mesmos em oficinas de mapas e reuniões preparatória, em agosto de 2012 e junho de 2013.

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Na parte da tarde a palestra pautou mais especificamente as experiências sociais de ameaçados pelos projetos hidroelétricos de Marabá e Santa Izabel, respectivamente, nos rios Tocantins e Araguaia, no Pará. A atividade foi retomada com a exibição do documentário “Araguaia – rios de Direitos”. Após que, Maria da Trindade (da vila Espírito Santo) e Gisely Sousa Moura (da vila Santa Izabel), ambas moradoras de comunidades ameaçadas e militantes do MAB passaram a explanar as situações e preocupações quanto a construção de barragens na região.

Na discussão tema a professora Idelma Santiago e Edilson Gondim, aluno e professora da UNIFESSPA, passaram tratar situações registradas em Santa Izabel. E acerca dos relatos de experiências na documentação de história oral na Vila onde filmaram o documentário “Araguaia – rios de Direitos”.

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Subsequente a cada mesa procedeu-se um debate com intervenções e perguntas de parte de alunos, professores e movimentos sociais. Pelo qual foi ressaltada a forma de atuação dos empreendedores e do próprio governo, as questões ambientais, sociais e falta de informações e de consulta na implementação desses grandes projetos. Ademais, frisou-se a importância de debates como este, dentro e fora da universidade, pelo seu caráter problematizador, teórico e informativo.

Nesse aspecto em sua fala inicial Esmael Rodrigues apontou que: “há muito tempo se vinha discutindo a saída dos muros da universidade. E o movimento andava só, brigava, lutava, discutia (…), mas, não tinha teoria, porque a universidade era presa dentro de um muro. E que muitas das vezes contribuía para as leis, para a implantação das construções, e que caia como rolo compressor em cima da gente – movimentos sociais. E graças a Deus, graças novas cabeças que estão vindo, quebraram esse tabu!. E hoje nos estamos aqui, discutindo com alunos, professores. Então, pra universidade esse é um fato muito interessante, muito interessante pra nós. Porque agora nós estamos com o corpo, e com a prática e com a teoria também. Estamos com vocês…”.

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