Nova Cartografia Social Da Amazônia

Oficina de Mapas no “Village Amerindien Arowaka, Sainte Rose de Lima”, Matoury- Guiana Francesa


Os indígenas Arowaka, du village amerindien Sainte Rose de Lima, Matoury, em Guiana Francesa iniciaram os trabalhos de cartografia social em novembro de 2012 com a participação da pesquisadora Raphaelle Hartemann, que é também membro da Association Kayeno e reconhece a sua identidade Arowaka. Esta oficina de mapas insere-se nos objetivos do Projeto “Mapeamento de Povos e Comunidades Tradicionais na Pan-Amazônia: uma rede social em consolidação”.

Nos dias 27 e 28 de julho de 2013 estiveram reunidas 16 pessoas na Sede da Associação Kayeno para realizar a autocartografia, que permitiu descrever a territorialidade especifica dos Arowaka e refletir as profundas mudanças registradas em mais de 60 anos. A língua é o critério da identidade do grupo e que para eles é objeto de uma retificação quando se denominam Arowaka, no lugar de Arawak, Lokono que significa indígena, em termos genéricos.

29 001No carbet foi feita a fotografia do grupo de participantes na oficina de mapas. De esquerda a direita: Charles Wingarde (Capitão do Village Amerindien), Sandra Wingarde, Denny Caboelefodo, Georgetina Biawana, Simona Jubuthana, Cleane de Sousa Gois, Christina Biswana, Raphaelle Hartemann, Ursula Visser-Biswane (Presidente da Associalção Kayeno), Hubert Henri Biswana. Na frente, às jovens Marcella Biswana e Gabrielle Hartemann.

O capitão dos Arowaka, Charles Wingarde narrou que nos anos 40 seus avos faziam um percurso desde Cécilia até este lugar, hoje conhecido por Village Amerindien Sainte Rose de Lima, para plantar mandioca, abacaxi, milho, batata doce. Refletindo sobre essa jornada decidiram construir vários carbet (casa construída com madeira e com cobertura feita da palmeira chamada ‘trouli’). Assim, formou-se um novo povoado, que ficava mais distante de Caiena onde os Arowaka costumavam vender a mandioca e o milho e fazer pequenas compras de alimentos, roupas e combustível.

29 02Abertura de uma roça (abattis) no sitio que se transformaria em Sainte Rose de Lima (foto de 1978 e produto do levantamento de documentação feita pelo Senhor W. Visser)

A Senhora Ursula Visser-Biswane narrava sua primeira impressão de Sainte Rose de Lima quando ali chegou em 1972: “todo era ainda uma floresta”. Outra lembrança, muito viva na sua memória, eram as pequenas “casas de papelão”. As pessoas pescavam, caçavam e faziam livremente a agricultura. O Senhor Hubert Henri Biswana, sobrinho da Sra. Ursula, veio da aldeia Arowaka de Cassipora, em Suriname. Também esteve em Matá, outra aldeia Arowaka desse pais. Na sua fala comparou Cassipora, com muitas famílias e roças e a aldeia Sainte Rose de Lima, com menor numero de famílias e área reduzida. Comentou que com a “guerra em Suriname”, muitos Arowaca abandonaram Cassipora e estão morando em Paramaribo.

29 03Foto de W. Visser, da Associação Cultural Kayeno, a partir de diapósitivas encontradas entre famílias Arowakas (provavelmente de 1978).

O que significa falar de mudança social para os Arowaka? O povoado recebeu o “titulo de propriedade” pelas autoridades departamentais em 1996. Eles reconhecem o peso das interdições de realizar a pesca, coleta do açaí, caça e agricultura. Essas interdições entram em contradição com suas formas de vida. Atualmente, as famílias recém-fornadas não podem fazer suas casas. No povoado vivem 80 famílias que não tem direito a realizar qualquer alteração nas moradias. Se antes podiam pescar no Lago Marran, este hoje forma parte de uma propriedade privada e nele somente praticam esportes como o kayaque. O pequeno igarapé que corta o território está poluído pelos dejetos das residências e outras construções.

Na oficina de mapas foram produzidas quatro representações. A primeira é um desenho geométrico no qual as formas pintadas de cor marrom significam o território e o azul listrado as propriedades privadas que o rodeiam. Neste foi escrito Vorhora Arwaka St. Rose de Lima, que significa NOSSA ALDEIA ST. ROSE DE LIMA.

29 04Denny Caboelefodo e ajudado por Marcella Biswana na apresentação do primeiro croqui.

O segundo é o croqui do território com as 80 casas assinaladas por triângulos azuis, os caminhos entre elas traçados em linhas vermelhas; também se destacam a floresta, o igarapé, os campos de futebol. No denominado Plateau B indicaram a Estatua feita por Denny Caboelefodo, uma pequena roça e uma faixa de floresta proibida de utilizar. O desenho do avião serve para indicar a proximidade com o Aeroporto Felix Eboué, contabilizando uma perda de 4 hectares do território para essa obra. Descreveram a Estrada Nacional e o Entroncamento onde foi erguida um monumento que homenageia aos seis povos indígenas da Guiana.

29 05Christina Biswana expõe o croqui e a legenda elaborados pelo seu grupo.

O terceiro croqui é a representação do primeiro assentamento, com as pequenas casas de paredes de papelão e a floresta em pé. O quarto croqui tem por titulo “Les interdits subis par les Lokonon Arowak de St. Rose de Lima de Matoury”. No mapa da Guiana Francesa, observa-se o símbolo da interdição e à direita o nome do Village Amerindien. Uma arma sem cartuchos simboliza o impedimento de caçar, uma linha e anzol sem peixe, a proibição de pescar; o cesto vazio a interdição de coletar os frutos, a faca e a palmeira separadas querem revelar a proibição de retirar as palmeiras. Os Arowakas, amantes do vinho do açaí são proibidos de retirar e utilizar seus frutos.

29 06Cleane de Sousa Gois e Marcella Biswana detalham as interdições experimentadas pelos Arowaka de Sainte Rose de Lima.

Os Arowaka, conscientes de sua riqueza cultural e linguística, estão desenvolvendo o aprendizado da língua, revendo seu trabalho artesanal, as danças e as músicas, ao mesmo tempo em que, fazem o levantamento de trabalhos acadêmicos que abordam sua existência social e cultural. Eles realizam observações criticas daqueles discursos que falam do seu “empobrecimento cultural” por viver próximos da cidade e o fato de ter sido transformados em trabalhadores assalariados!!!.

O futuro é a grande questão para os Arowaka que como comenta Christina Biswana é objeto das conversas com seus filhos. Na escola, as crianças são proibidas de falar a língua, pois é a língua francesa a única aceita. Varias questões desafiam os Arowaka: a estabilidade e autonomia no território, a continuidade e renovação cultural, os estudos das crianças e dos adolescentes e sua vida profissional. Christina Biswana, mãe de seis filhos, afirmava com convicção: “Nós não podemos deixar nossos filhos, nós devemos saber defender os Arowaka”.

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