Nova Cartografia Social Da Amazônia

GARIMPEIROS, PESCADORES, ASSENTADOS E INDÍGENAS PARTICIPAM DE OFICINAS DE MAPEAMENTO SOCIAL NA VOLTA GRANDE DO XINGU E DEBATEM OS EFEITOS DA UHE BELO MONTE E AMEAÇAS DO PROJETO VOLTA GRANDE DE MINERAÇÃO


Comunidades tradicionais que vivem na Volta Grande do Xingu estiveram reunidas para realizar oficinas de mapeamento social em trabalho que se estendeu de 19 a 25 de agosto de 2017, com atividades na Vila da Ressaca, Ilha da Fazenda, Travessão João Bispo e Travessão do Sítio Volta Grade.

Na Vila Ressaca atualiza-se a questão do presente e do futuro dos garimpeiros diante a instalação do projeto da Mineração Belo Sun Ltda. Desde o inicio desta década os moradores estão em estado de tensão pelas compras de terras de garimpo e de casas na própria vila. 0s cadastros e as interdições que partem dos orgãos oficiais e oficiosos sobre o garimpo artesanal na área, especificamente por parte do DNPM e das mineradoras que funcionaram antes (Oca, Verena), agora com a empresa Mineração Belo Sun Ltda. São reacionados. Eles acompanham a rápida redução da economia local – os empregos e o comercio; as trocas e os negocios com os colonos ou assentados; as diversas reuniões convocadas e, no conjunto, a constatação da progressiva retirada de direitos, como a não renovação da licença de lavra, a favor dos garimpeiros.

As dúvidas e questionamentos expostos pelos participantes são relacionados às compras de terras feita pela mineradora, às desapropriações e indenizações. Sobre a política de indenizações da empresa comentaram sua forma especulativa e indigna e as tensões internas que provoca. Destacaram a oferta de empregos do projeto como a maior “mentira”, “falsa”, e reafirmaram a importancia do garimpo na Volta Grande do Xingu para a economia de Altamira e toda a região da Volta Grande do Xingu.

No domingo 20 de agosto os garimpeiros e garimpeiras estiveram presentes na sede da Cooperativa dos Garimpeiros da Ressaca e Ilha da Fazenda para debater as situações dos garimpos.

No trabalho de campo foram visitados os “serviços” de garimpeiros para extrair ouro da Ressaca, Grota Seca, Serrinha, Galo e Ouro Verde, que representam a resistência ante o projeto da Mineradora Belo Sun. Nas noites foram apresentados alguns vídeos (Belo Monte: depois da inundação e outro sobre o desastre da Samarco) e realizados debates sobre notícias em matéria de mineração no Brasil.

Os garimpeiros mencionaram que eles praticam o garimpo, mas também possuem roças, retiram o açaí (plantados nas terras mineradas), pescam, além de ser mecânicos, comerciantes, descobridores de minerais, inventores de soluções e inovadores. Na fotografia três garimpeiros consertam um “moinho” de pedras.

Na fotografia, os ribeirinhos e pescadores que moram na ilha da Fazenda assistem o vídeo documentário acima citado.

As oficinas da nova cartografia social na Ilha da Fazenda foram marcadas para os dias 22 e 23 de agosto. O resultado da atividade foi um conjunto de quadros, resumo da situação dos ribeirinhos e pescadores na Ilha de Fazenda, após a inundação do lago e funcionamento da UHE Belo Monte. Um destaque foi dado à mudança dos cardumes e desaparecimento de espécies, como o peixe Curimatá. Já o Pacu, dizem, “ficou magro”. Também as mudanças do rio, que antes não tinha bancos de areia. Hoje o rio está sem velocidade e está ficando a área, foi a explicação deles.

Na oficina foram feitas legendas indicando a situação das espécies. O Sr. Miguel fez o desenho dos peixes, entre eles de um Tucunaré.

Desenho do peixe Tucunaré pelo senhor Miguel

Os trabalhos de infraestrutura de responsabilidade da Norte Energia como a distribuição de água potável ficaram inconclusos, semelhante ao que ocorre com o sistema de esgoto e o posto de saúde. O povoado com mais de 60 casas não dispõem de energia elétrica. A Norte Energia prometeu placas de energia solar e ainda não cumpriu. Recentemente, foi criada a AMIF – Associação dos Moradores da Ilha da Fazenda para reivindicar direitos. Os moradores temem que a situação da Vila da Ressaca os afete ainda mais.

Durante os trabalhos foi elaborado um croqui com o nome de 17 ilhas próximas à ilha da Fazenda e o detalhamento d as atividades, as mudanças e as situações particulares a cada uma delas. Entre os detalhes da vegetação está a frequência de arvores de Castanha, jabutiqueira e palma babaçu, espécie muito utilizada para cobrir os tetos das casas e paredes, além do uso alimentício. Essas informações estão ausentes nos estudos presentados pela Mineração Belo Sun.

No Travessão João Bispo foram convidadas todas as famílias contudo a chuva e condição da estrada reduziu os presentes. A reunião foi realizada na casa de Dona Madalena, ex-garimpeira que vive no lote com seus cinco filhos adultos e já com família formada. As moradias das famílias do Travessão João Bispo estão localizadas entre “Belo Sun e Belo Monte”. A família é vizinha de pessoas já indenizadas, como o senhor Albino. Dona Madalena não tinha lote na Transamazônica e comprou terras com o interesse de plantar cacau, que tem cultivado com esmero. Taiane e Diego, um casal jovem, está tentando ter a terra e tem a posição firme de continuar a vida no Travessão. Diego vivia no bairro Baixão do Tufi, em Altamira, e perdeu tudo quando entraram os tratores a derrubar as últimas casas.

Este Travessão está nas adjacências da área planejada para construir a barragem de rejeitos. No território observam o secamento do igarapé João Bispo.

Oficina de mapeamento social realizado no Travessão João Bispo.

As crianças colaboram na elaboração das legendas.

O PA Ressaca, localizado no município Senador José Porfírio, foi criado em setembro de 1999. Está compreendido na Gleba Ituna, terra pública arrecadada e matriculada em nome da União em 28/07/1982. Este PA tem capacidade para 500 famílias e tem área de 30.265,63 hectares. A maioria dos assentados já está registrado no CAR e confere-se que existem dois imóveis rurais, um de 521,07 hectares e outro de 1.454,23 hectares, acima de 4 módulos fiscais (o módulo fiscal no município é de 70 hectares) que estão se sobrepondo às terras do assentamento. Há indícios de apossamento ilegal e grilagem. Em consonância com o disposto no art. 21 da Lei nº 13.465, de 11 de julho de 2017, o projeto de assentamento Ressaca deverá ser consolidado, titulado e emancipado nos próximos três anos (até 2020), o que poderá implicar na reconcentração de terras causada pelos mecanismos de apropriação inerentes ao mercado fundiário.

No Travessão do Sítio Volta Grande a oficina foi realizada na casa do senhor João Xipaia e sua esposa Maria dos Santos Leite. Parte da terra dos Xipaia foi vendida por um irmão para a Mineradora Verena, no que eles denominam “tempo da Verena” a qual posteriormente vendeu a área para a Mineração Belo Sun e procedeu a instalar o acampamento.

No Sítio Volta Grande a família do Sr. João Xipaia e Maria dos Santos Leite elaboram o croqui

Os presentes procedem a elaborar o croqui e as legendas. No primeiro destacaram uma faixa de terras intrusada pela mineração Belo Sun.

As famílias do Sítio Volta Grande expuseram sua vontade de permanecer na terra e se negam a mudar para as vilas e casas propostas. A denúncia de destruição de castanheiras foi reiterada dizendo que a derrubada da castanha é para fazer casas e é feita por “esse pessoal que vem de fora”.

A equipe de pesquisa é integrada por Dimitria Leão, Luana Peixoto, Jeremias Kayapó, José Alberto Braz de Lima, colaboradores do Movimento Xingu Vivo para Sempre e Rosa Elizabeth Acevedo Marin (UFPA, Professora no curso de Etnodesenvolvimento do Campus de Altamira e pesquisadora do Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia. Diversos contatos e reuniões antecederam a esta etapa de trabalho e foram articuladas por Dimitria Leão, Luana Peixoto e Ana Barbosa e João Neto.

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