A II Virada Antropológica do Programa de Pós-Graduação em Cartografia Social e Política da Amazônia (PGCSPA) ocorreu no dia vinte e um de março na Companhia Circense de Teatro e Bonecos, na Praia Grande, São Luís (MA). O evento homenageou Daniel Brasil (in memorian) e Eleazar Yriza (in memorian) com poemas, músicas, mímica, tambor de crioula e lançamento de livros.
Logo na chegada os convidados foram recebidos com um tambor de crioula conhecido como Tambor da Lua comandado pelo Mestre Macaxeira. Como primeira atividade o ator Hélio Martins declamou um poema de Daniel Brasil e a professora Rosa Elizabeth Acevedo falou sobre a trajetória de Eleazar Yriza, venezuelano, vinculado ao Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia (PNCSA), assassinado em janeiro deste ano.
O mímico maranhense Gilson Cesar apresentou o seu espetáculo circense que retratou a contradição da vida dos artistas que transmitem alegria e, ao mesmo tempo, enfrentam dificuldades de diferentes ordens no seu dia-a-dia como a falta de políticas direcionadas às artes.
Os quenianos Hillary Kodieny e Johanna Wanjala, do Kenyan Land Alliance (KLA), e Samuel Ouma, da Universidade de Nairobi, estiveram presentes no evento e fizeram uma bela saudação que foi acompanhada com palmas por todos os presentes. Eles estão participando de uma comissão científica do PPGCSPA que compreende intercambio de experiências de mapeamento social entre o Brasil e o Quênia.
Na sequencia foram lançados os seguintes livros produzidos no âmbito do PPGCSPA: “Povos Tradicionais em colisão com estratégias empresariais no Maranhão e Pará”, organizado por Rosa Elizabeth Acevedo Marin & Jurandir Santos de Novaes; “Nice Guerreira: Mulher, quilombola e extrativista da floresta”, de autoria da senhora Nice Machado Aires e organizado por Camila do Valle, Cynthia Martins e Patrícia Portela; “Lutas em Memória: a luta pelas terras reforçadas pela luta em defesa dos territórios quilombolas” de autoria de Aniceto Pereira, Dorinete Serejo, Marcos Antonio Pinho Diniz e Samuel Moraes; “Direitos; Resistências e mobilizações: A luta dos Quilombolas de Alcântara Contra a Base Espacial”, de autoria do senhor Leonardo dos Anjos e organizado por Patrícia Portela, Davi Pereira Júnior e Cynthia Martins.
Os autores estavam presentes no lançamento e ressaltaram os recentes conflitos que suas comunidades estão vivenciando face à implantação de grandes projetos privados ou governamentais. Os quilombolas de Alcântara falaram das recentes investidas dos Estados Unidos em relação ao Centro de Lançamento de Alcântara e as articulações governamentais que estão deixando de fora as formas organizativas e os movimentos sociais de Alcântara, como o Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Alcântara e o Movimento dos Atingidos pela Base Espacial.
A iniciativa da II Virada Antropológica consiste em integrar arte, produção acadêmica e saberes de povos e comunidades tradicionais, propiciando uma possibilidade de diálogo e “interação na resistência” entre campos diferenciados da produção. A iniciativa começou em 2016 com a I Virada, que reuniu aproximadamente 200 pessoas. Na ocasião foi lançado o livro do senhor Ednaldo Padilha intitulado “Resistência e Fé”. O seu Ednaldo, conhecido como Cabeça esteve presente na II Jornada Antropológica, com o Prof. Roque Laraia, e se pronunciou em relação aos conflitos da Baixada e a importância da Coleção “Narrativas Quilombolas.” Ele ressaltou que seu livro está esgotado e aguardando uma nova edição.
A II Virada Antropológica fechou com os shows de Zé Maria e casca de banana e Célia Sampaio, que contou com a animação dos presentes que dançaram e cantaram.
“Por que a arte é criação como tudo. Por que ela se diferencia de tudo por ser a universal ludicidade de todas as etnias. E, diga-se de passagem: a arte diz respeito a tod@s e, principalmente aos alegres lutadores. Quais? – aqueles que mais sofrem com a violência da ilegalidade instituída”. CCM
POEMA DE DANIEL BRASIL
Um bispo, um cavalo e uma torre
Que se move contra o infinito
E se arrisca na luta
Junta rei-peão e rainha
Quem tira a faca da bainha
E risca terra e chão
Não perde a linha
Quem são os que morrerão
E faz de conta e ginga
Contra a torre que se aproxima
Quem brinca com o tempo
E pula os quadrantes da vida
Entre copos e dedos de prosa
Quem bebe a podóia amarga
E joga com a bílis sofrida
No nascer da aurora
Quem mora na roça que ninguém sabe onde
E porque não se esconde
Entrevendo os caminhos da morte
Quem morde a corda e não arrebenta
E esquenta as mãos nos arreios do tempo
Lento, chega quando não se espera
Quem prega a diagonal
E se move do preto ao branco
Manto vermelho, monte verde
Qual fonte perde e ganha
E com manha sim e força não
Acorda pra cuspir no novo dia
Quem pula as linhas definidas
E monta na sela da incerteza
Encaborjado vaqueiro sem cheque
Quem mata a fome da valentia
E espraia luz constante e vadia
Quem guia, quem guia.