Na noite do dia 22, no Teatro do Moa, no Campus Floresta da UFAC, em Cruzeiro do Sul, foi realizado o evento “Conhecimentos Tradicionais Contra o Desmatamento”, que reuniu professores, alunos e representantes de povos indígenas e populações tradicionais da região do Vale do Juruá para uma discussão e exposição sobre o tema. A realização foi fruto da parceria entre o Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia (PNCSA), o Laboratório de Antropologia e Florestas (AFLORA, da UFAC) e o Grupo Vida e Esperança (composto por agricultores da Reserva Extrativista do Alto Juruá).
Como se sabe, o Vale do Juruá é uma área com forte presença de povos indígenas e também de extrativistas e agricultores, distribuídos num mosaico de Terras Indígenas e Unidades de Conservação. A região abriga uma expressiva biodiversidade (comprovada por diversos estudos científicos) e significativa sociodiversidade, inclusive com a presença de povos autóctones em estado de isolamento voluntário (conhecidos como “isolados”).
No Vale do Juruá, notadamente nos altos rios Juruá, Tarauacá e afluentes, estão em curso há mais de 20 anos experiências diversas de construção de alternativas ao modelo de desenvolvimento hegemônico: aquele que, fundamentado justamente no conhecimento científico, tem apontado como caminhos para o país, e a Amazônia, o agronegócio, o manejo florestal madeireiro, a construção de hidrelétricas, projetos de mineração, entre outros igualmente impactantes do ponto de vista social e ambiental.
Por outro lado, dentro do próprio meio acadêmico esta modalidade de associação entre conhecimento e desenvolvimento tem sido criticada, e não são poucos os pesquisadores que apontam, por um lado, para o caráter homogeneizante e predatório deste tipo de desenvolvimento (com suas monoculturas de produtos e também da mente) e, por outro lado, para a necessidade de valorizar e dar maior visibilidade aos povos e comunidades que, por meio de seus conhecimentos e das experiências que os expressam, apontam para outras possibilidades de posse e uso dos recursos naturais pelas sociedades humanas, com maior liberdade e respeito. Longe de serem conhecimentos ultrapassados ou antigos, os chamados “conhecimentos tradicionais”, dizem muitos estudiosos não só das ciências humanas, se renovam constantemente e circulam livremente entre seus detentores, produzindo, neste movimento, diversidade (seja ela biológica ou cultural). É neste rumo que comunidades e povos do Vale do Juruá desenvolvem experiências de educação (lato sensu), de implantação de sistemas agroflorestais e jardins medicinais, de segurança e autonomia alimentares, de planejamento comunitário de uso e proteção de seus territórios, de troca de sementes e mudas (e de recusa aos trangênicos, agrotóxicos e fertilizantes industriais), de valorização cultural, entre outras.
Dentro deste espírito, no evento realizado no Teatro do Moa, para a mesa de palestrantes foram convidados tanto pesquisadores acadêmicos – como Alfredo Wagner de Almeida, coordenador do PNCSA e professor da UEA e UFAM, Mauro Almeida, da UNICAMP, Maria Inês de Almeida, da UFMG, e Terri Aquino, do PNCSA – quanto o sertanista José Carlos Reis Meirelles Jr., o pesquisador indígena Ibã Huni Kuin e o professor de agricultura florestal Antonio Teixeira da Costa.
Além das palestras e debates, foi exposto o trabalho de cartografia social de conhecimentos tradicionais que fora realizado nos dias anteriores, no Encontro Regional do Acre, intitulado “Encontro Amazônico de Saberes Consorciados Contra o Desmatamento”. No Encontro, que reuniu pesquisadores acadêmicos e da floresta, em particular da Reserva Extrativista do Alto Juruá e das Terras Indígenas Kaxinawá e Ashaninka localizadas nos rios Jordão, Breu e Humaitá, entre outros, a ideia de uma rede de conhecimentos e conhecedores, que articule universidade e comunidades locais, foi debatida.