A Associação de Remanescentes de Quilombo Nova Esperança de Concórdia – ARQUINEC foi a anfitriã no lançamento do Boletim 9 Guerra do Dendê, realizado no dia 4 de abril, na Casa de Farinha da Comunidade de Santo Antônio. Entre os fatos que singularizam esse lançamento estão: presença de jovens quilombolas que recentemente iniciaram seus cursos universitários (Educação no Campo e Direito); participação de um grupo de parentes que vive em Belém e se encontrava de visita à família do senhor Tibúrcio Valino da Costa; ausência de alguns jovens que participaram nas oficinas e hoje formam parte da Associação Remanescente dos Quilombo das comunidades da região do Cravo – ARQUIC. A explicação apresentada para a existência dessa nova associação é que suas demandas por titulação se enfraqueceram após a fragmentação da titulação (apenas foi titulada a área da ARQUINEC, ficando sem titulo a ARQUIOB) e decidiram por esta estratégia. Enquanto, isto o seu território é rodeado de áreas que foram compradas para instalar o mono cultivo de dendê.
Os trabalhos de pesquisa para elaboração do Boletim foram intensos no ano 2011 e 2012 e a atividade mais recente ocorreu em outubro de 2013, durante o Seminário “Os impactos sociais e ambientais dos investimentos em dendê no Pará” (Universidade Federal do Pará/Universidade Livre de Berlim e Projeto Nova Cartografia Social) e foi sobre essa escala de tempo, praticamente 18 meses, que se fez um exercício de cotejamento sobre as mudanças ocorridas.
Na continuidade da apresentação dos convidados, Sebastião Pereira da Costa, ex-presidente da ARQUINEC, destacou o quanto é oportuno a divulgação do Boletim Guerra do Dendê e explanou sobre as mudanças. Houve uma intensificação da abertura de ramais por parte da BIOVALE; no território titulado hoje existem 91 casas do Programa Minha Casa, Minha Vida, sendo que em Santo Antônio foram construídas 19 unidades; a comunidade de Curupere está rodeada de plantação de dendê e destacou a foz do rio Curupere, do lado esquerdo. Na região aumentou o numero de agricultores que entraram ou pretendem fazer o cultivo. Com o mapa que consta do Boletim afirmou “o território quilombola está rodeado do monocultivo” e apontou a aproximação com o município de São Domingos do Capim – estratégico para esse cultivo e para o transporte de soja e dendê pela nova ponte construída sobre o rio Capim.
No sentido de insistir sobre os impactos ambientais explicou a situação de contaminação do igarapé Cravo, o que foi reforçado dizendo que metade desse igarapé está perdido e acrescentou que “quando eles se deram conta os que se apropriaram das nascentes as destruíram e agora foram vendidas para a BIOVALE e estão entregues ao dendê”.
Outro impacto ambiental destacado pelos presentes é observado na mortandade das abelhas. No KM 47 um produtor perdeu 40 caixas. Esses prejuízos resultam do uso de agrotóxicos.
Na contramão dessa destruição Sebastião Pereira da Costa assinalou a alternativa de produção que representam os territórios quilombolas. A organização tem permitido que vendam alimentos para o Programa da Merenda Escolar e calculou essa produção em toneladas. Informando a grande diversidade: folhagem, maxixe, açaí, macaxeira, polpa de frutas, o que estabelece um grande diferencial. Essa agricultura orgânica é o presente e o futuro para alimentação das famílias. A segurança alimentar dos quilombolas se torna a grande batalha a vencer frente ao dendê
Os quilombolas comentaram as ameaças de redução dos trabalhadores da BIOVALE de 900 para 500 e acrescentaram observações sobre a precariedade do trabalho nesse empreendimento.
Como reagiram os parentes que não vivem no território ao debate que foi produzido durante o lançamento?
A senhora Luiza Costa que está há 37 anos fora do território ficou surpresa e falou: “Eu não tinha noção de que estavam acabando com os nossos igarapés. Eu tomava banho, ia pescar. As empresas funcionam como um rolo compressor que expulsam as pessoas, destroem onde elas moravam e o que elas cuidavam com tanto amor”. O senhor José Costa foi enfático na critica a esta “euforia do dendê e agora podemos dizer que o impacto do dendê é maior do que o da seringa, porque destrói os igarapés, os solos e nos temos que saber a quem interessa o plantio do dendê? A quem beneficia, como elas se unem e porque estão unidas? Fazendo alusão ao filme Spartacus passou a explicar porque as empresas tem interesse na divisão do grupo, pois “quando alguém se divide fica mais fraco, unidos ficamos mais fortes e é necessário lutar contra o poder que rompe e corrompe. Há que estar unido para combater essa expansão, ela esta se tornando como uma hidra, ela é uma hidra”. O jovem Rogerio exemplificou o sucesso de uma ação da comunidade para evitar que o dono da fazenda Ouro Verde concretiza-se o seu projeto de venda, ”a comunidade toda se uniu e com isto impediram a entrada do dendê na comunidade”.
O grupo assumiu novas tarefas de envolver os que não estiveram presentes no lançamento do Boletim Guerra do Dendê, a saber outras Associações, Sindicato, Associações de Agricultores assim como realizar a divulgação nas escolas. A prioridade é inserir esse debate nas atividades escolares, divulgar na Câmara e Secretarias do poder municipal.