Nova Cartografia Social Da Amazônia

NOTA TÉCNICA: PROF. PERY TEIXEIRA; “Projeto de Reconhecimento Sociodemográfico da População Indígena da Cidade de Tabatinga – AM”


SOBRE UM RECENSEAMENTO SOCIODEMOGRÁFICO PARTICIPATIVO REALIZADO NO MUNICÍPIO DE TABATINGA, ESTADO DO AMAZONAS

 

As fontes de informações demográficas e socioeconômicas sobre a população indígena no Brasil possuem deficiências que as tornam, as mais das vezes, insuficientes para as análises que serviriam como subsídios para a elaboração de projetos de desenvolvimento econômico e social dessa população. As duas mais importantes e abrangentes são o SIASI (Sistema de Informações da Atenção à Saúde Indígena) e o IBGE. O primeiro deles ainda enfrenta problemas de estruturação e de gerenciamento que o impedem de ser referência na quantificação da população indígena (em qualquer agregação territorial) e na disponibilização de informações sobre a saúde dos povos indígenas. Por outro lado, os censos demográficos do IBGE, especialmente no que se refere às áreas urbanas, tem mostrado, de um lado, inconsistências, sub-registros e  irregularidades na evolução dos dados levantados, não permitindo que se conheça, com alguma precisão, o número de indígenas em cidades como São Paulo, Salvador ou Manaus. Além disso, o tamanho da amostra censitária, de onde se levantam as principais informações socioeconômicas da população, é insuficiente para o que se refere à população indígena, especialmente nas cidades de porte médio e pequeno ou de quantidade reduzida de indígenas.

Tais deficiências fazem-se sentir com intensidade em muitas das cidades amazônicas, em que variações temporais inesperadas e inusitadas ou sub-enumerações dos efetivos indígenas tem chamado a atenção dos estudiosos. Assim, por exemplo, pelos dados oficiais os indígenas residentes na cidade de Santo Antônio do Içá (Microrregião do Alto Solimões – estado do Amazonas), em número de 78 em 2000, e os 79 de São Paulo de Olivença, na mesma microrregião e no mesmo ano, tiveram suas populações aumentadas, respectivamente, em 2010, para 1.515 e 2.222. No mesmo período, a cidade de Parintins, também no Amazonas, “cresceu” sua população indígena de 61 para 442 habitantes. Nessa cidade, um recenseamento específico para a população sateré-mawé residente registrou, em 2002, 512 moradores dessa etnia, o que mostra a expressiva sub-enumeração dos indígenas da cidade no censo oficial de 2000, além de provável sub-enumeração em 2010 (ressalte-se que os Sateré-Mawé não são a única etnia ali presente). Em sentido contrário, a cidade amazonense de Novo Aripuanã registrou, pelos os dados censitários oficiais de 2000 e 2010, decréscimo extraordinário da população indígena, tendo passado de 623 para 15 habitantes naquele período.

Esse contexto de insuficiências e deficiências de nossas principais fontes de informação sociodemográfica tem contribuído para a “invisibilidade” de grandes parcelas da população indígena nas cidades amazônicas, que constitui um dos determinantes da inexistência de políticas públicas voltadas para esses moradores ou, mesmo, do desinteresse não disfarçado de autoridades municipais e estaduais em propiciar melhores condições de existência para eles. Tal situação está na origem da elaboração e execução de um projeto de recenseamento sociodemográfico participativo da população indígena no município de Tabatinga (AM), nos moldes do realizado em Parintins em 2002, Duas áreas foram recenseadas, iniciando-se a Terra Indígena (TI) Tukuna Umariaçu, situada nas imediações da sede municipal, com o objetivo de buscar uma base quantitativa suficiente para a construção de indicadores sociodemográficos e de levantar informações não contempladas nos censos oficiais (sobre economia, leitura e redação da língua materna, clã de pertencimento, acesso à Internet, atenção à saúde, características da gravidez e do parto, etc.). Em sequência, o recenseamento deu-se na cidade de Tabatinga, tendo por objetivo verificar a cobertura do censo demográfico de 2010 para a população indígena urbana, especialmente das duas etnias mais representativas localmente – Kokama e Ticuna.

Três tipos de formulários de pesquisa (Domicílio, Indívíduo e Produção Rconômica) foram utilizados na terra indígena e dois (Domicílio e Indíviduo) na cidade. Embora com diferenças devido a características socioculturais dos dois locais, a maioria dos quesitos dos respectivos formulários para domicílio e indivíduo eram iguais, englobando uma multiciplicidade de temas, como características da habitação, saneamento básico, equipamentos na residência, estrutura etária e por sexo, posse de documentos de identificação, idioma falado, lido e escrito, etnia de pertencimento, clã (na terra indígena), estado conjugal, instrução, migração, trabalho, renda, atenção à saúde, saúde bucal, fecundidade, mortalidade, indicadores sobre gravidez e parto, etc). .

Vários das informações levantadas e indicadores calculados a partir deles foram apresentados às comunidades indígenas e a instituições parceiras na TI Umariaçu e na cidade de Tabatinga.. O conjunto completo das bases de dados está disponibilizada para aquelas comunidades, e um treinamento específico para sua utilização contou com a participação de indígenas Ticuna e Kokama indicada por suas respectivas comunidades e associações, além de funcionários e técnicos das referidas instituições.

 

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