Carta de apoio à Comunidade Tradicional de Fundo de Pasto de Caboclo
Viemos a público manifestar nosso apoio à luta da Comunidade Tradicional de Fundo de Pasto de Caboclo, Juazeiro-BA, em face das investidas da empresa de mineração Pedras do Brasil Comércio Importação e Exportação LTDA que, desde dezembro de 2017, deu início a pesquisas minerárias ilegais e invasões em seu território tradicional. A Associação conta que constatou a existência do processo de licenciamento ambiental nº 13.335/2018, que culminou na expedição de Licença ambiental publicada na Resolução SEMAURB nº 275/2019 e diante destas informações, buscou à época acessar o processo administrativo citado acima junto à Secretaria de Meio Ambiente e Ordenamento Urbano de Juazeiro (SEMAURB), porém não obteve êxito. Logo após encaminhou ofício ao Ministério Público Estadual (MPE), informando tais atos, o que deu origem ao Inquérito Civil nº 598.9.538/2020, ainda em trâmite na referida Promotoria.
No final de julho do presente ano (2023), a comunidade (associação) foi surpreendida com a intimação do Processo nº 8002097-63.2023.8.05.0146 movido por essa empresa, por meio do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA), contra o Município de Juazeiro e contra a Associação Comunitária Tradicional de Fundo de Pasto de Caboclo (ACTFPC), no qual requer como pedido principal o “suprimento judicial do consentimento”, tendo em vista que a referida comunidade tem defendido o Direito a consulta e consentimento, conforme previsto no artigo 6º, item I da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), agência multilateral da Organização das Nações Unidas. Este artigo afirma que os governos deverão “consultar os povos interessados, mediante procedimentos apropriados e, particularmente, através de suas instituições representativas, cada vez que sejam previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente”. Sabemos que a consulta livre, prévia, informada e de boa-fé é uma responsabilidade do Estado, não passível de delegação a uma empresa privada, muito menos à mesma empresa interessada na extração dos recursos, e que o Judiciário não tem o direito de consentir em nome da comunidade tradicional.
Diversos são os argumentos usados pela empresa, que não cabe aqui serem reproduzidos, no entanto, tamanha pressão jurídica é mais uma característica das artimanhas utilizadas por empresas mineradoras a fim de explorar os territórios, se valendo do afrouxamento da legislação (ou melhor, do estímulo envergonhado) promovido por governos tipicamente desenvolvimentistas. Finalmente, é preciso dizer que a comunidade deve ser respeitada e ouvida segundo suas razões, calcadas numa relação ancestral com seu território e definidora da soberania de sua posse.
Para além dessa disputa jurídica, a Associação Comunitária Tradicional de Fundo de Pasto de Caboclo (ACTFPC) sofreu um ato intimidador cuja autoria se desconhece até o momento. Poucos dias após instalarem duas placas de identificação do território com o objetivo de protegê-lo (uma na entrada, outra na saída do território), moradores notaram que elas foram retiradas e destruídas. A instalação das placas visou justamente identificar a área usada tradicionalmente, espaço fundamental para seus moradores, local onde expressam suas formas de produzir, criar e, portanto, viver.
Diante de todas estas ameaças, que reatualiza o que têm sofrido dezenas de comunidades tradicionais do norte baiano, o Cercos – Grupo de Estudos sobre Cercamentos, Controles e Mercados, da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), pede a entidades, organizações sociais e grupos de pesquisa que subscrevam esta carta, em apoio ao povo forte da Comunidade Tradicional de Fundo de Pasto de Caboclo, para que tenham seus direitos considerados, principalmente o direito à consulta (livre, prévia, informada e de boa-fé) e posteriormente que tenham seu consentimento ou não, respeitado.
Abaixo o link de acesso à carta para que subscrevam apoio à Comunidade Tradicional de Fundo de Pasto de Caboclo
https://docs.google.com/document/d/1XT7ZLlN7MnXVw4jfNCQ_xp40k9hwTn2ZaID2lbNYZUE/edit?pli=1